28/11/2023

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Ontem, trinta e oito.

Em cerca de 400 km feitos sozinho, muitos pensamentos me passaram pela cabeça, especialmente a ouvir música. 

Pensei em algo para escrever, em que me surgiu uma memória sobre uma pergunta que a S. me fez talvez há 15 anos: "Onde é que te vês daqui a 5 anos?"  Não fazia ideia o que responder. Se me perguntarem hoje, vou ficar sem saber o que responder. Não que não tenha objectivos, que não queira coisas... Mas a vida dá tantas voltas que sempre me pareceu descabido fazer planos a longo prazo. Já na altura tinha a noção que hoje vamos neste rumo, amanhã vamos noutro. Cedo aprendi a viver no momento e a aproveitar o hoje de forma mais intensa porque o amanhã nunca está garantido. Actualmente volto ao mesmo estado de espírito, a valorizar o momento, a viver o momento, a ser honesto sobre o que sinto, mas a ser menos comedido do que no passado, algo que pode ser demasiado para o mundo actual. 

Daqui a 5 anos não faço a mais pálida ideia onde vou estar, nem do que quero. Aliás, sei que quero continuar a ser a pessoa que sou hoje, onde sinto que não tenho nada a provar a ninguém, especialmente a mim, porque durante muito tempo tive dúvidas sobre se seria bom companheiro, depois sobre seria bom pai. 

Quanto ao dia em si, fui buscar as minhas meninas à escola, fomos almoçar junto ao mar, caminhámos um bocadinho, dei-lhes banho, penteei-as, lanchámos, acendi o recuperador, meti um cobertor no chão para vermos um filme com pipocas. O meu dia foi, de facto, dedicado a elas, mas quem me conhece sabe que isso é como um dia dedicado a mim. 

17/10/2023

A partida

Há um mês escrevi aqui que a situação da minha avó não estava favorável. Hoje deixou mesmo de estar. A minha avó, a minha segunda mãe, partiu. 

Amanhã despedimo-nos dela. Então hoje desfiz a barba, ela não gostava nada de me ver com a barba por desfazer, dizia que parecia um chibo, assim que parecia mais magro (na cara), saía um "estás magro que nem um cão". Todo um "amor duro" que era a sua maneira de dizer que fico melhor sem barba ou que se calhar não estou a comer o suficiente. Apesar da forma da mensagem, o conteúdo tinha origem no amor e carinho que tinha por nós. E é isso que devemos dar importância.  

Amanhã ou quinta-feira vou fazer um bolo, que aprendi na escola primária e que ela passou a fazer com regularidade, quase que tomando como seu a autoria daquele bolo, pelas vezes que o fez. 

A minha avó Marizé era rija, enviuvou duas vezes, criou 3 filhas, ajudou a criar netos e bisnetos e nunca a ouvi queixar-se da vida que tinha. 

Obrigado Avó. 

25/09/2023

Uma questão de tempo

Hoje em dia sou uma pessoa segura. Não acerca do exterior, isso não sei se alguma vez serei, mas tornei-me muito seguro em relação ao que sou no interior. 

Sempre fui um bocado inseguro, sempre achei que não seria bom o suficiente. Talvez por isso eu tente sempre ser boa pessoa, que aja sempre como se a minha consciência me estivesse a ver. Olhando para trás, questiono-me se isso poderá ter feito com que o meu Eu verdadeiro não se manifestasse, por querer ser algo que não sou, por querer agradar. 

Mas não. Sinto bem como sou, como sempre fui, a tentar sempre ajudar quando posso, a pensar nos outros primeiro, a tê-los em conta nas minhas acções, a tentar arranjar soluções para problemas, a ter sempre um ombro disponível, uma palavra amiga ou a fazer quilómetros. Ninguém é perfeito, isto foi um crescimento contínuo da minha essência que faz de mim o homem que sou hoje, o Pai que sou e o exemplo que quero ser para as minhas filhas. 

Noutra publicação falei acerca da vontade de partir. Era uma vontade que vinha e ia, uma ideia nada concreta. Acontece que a ideia ganhou força, foi-se sedimentando e levou-me equacionar seriamente essa possibilidade, a pesquisar possíveis ganhos e custos, a ponderar todos os impactos positivos e negativos, em mim e nos meus. E neste momento, parece-me que será uma questão de tempo até que isso se torne realidade. 

Vários factores terão que se alinhar, é certo, mas nada de impossível. Terá que abrir vaga no país de destino, dentro da organização onde já estou; terão que me aprovar a mobilidade para que possa sair, ambos os mais determinantes. 

E elas? Elas são o factor determinante da minha decisão. Eu não tenho dúvidas que elas estão bem com a mãe, que é boa mãe, boa pessoa e que as ama tanto quanto eu. Assim que eu sinta que elas lidam melhor com a minha ausência e com o facto de me verem em fins-de-semana alternados, tomarei essa decisão. Aliás, sinto que a decisão já está tomada, apenas aguardo para ter a certeza que a estabilidade emocional delas está, tanto quanto possível, garantida. 

E como alguém me disse, "não te estarias a mudar para a Austrália".

17/09/2023

Crónica de uma partida anunciada

Ninguém vive para sempre, todos nós cumprimos o nosso ciclo, mais longo ou mais curto, conforme a "sorte" que nos calha. Chegar a uma idade avançada significa, por norma, que cá se andou uma vida inteira, que ás vezes parecem duas ou três.

A minha avó está internada e, pelo telefonema que a minha mãe recebeu da minha tia, a situação não está favorável, ao contrário do que nos tinham dito há 3 dias. 

Neste momento, tenho um misto de sentimentos dentro de mim. Ora me preparo para o que aí vem, para que quando aconteça, consiga estar capaz de apoiar a minha mãe, ora penso positivo e que ela vai superar mais esta barreira. Mas será que vale a pena? Será que o ciclo dela já terminou? Será egoísmo nosso querer que ela fique mais uns anos conosco? 

No fundo, é de tudo um pouco. A qualidade de vida que ela tem já não é, de todo, a mesma, o discernimento esse já foi embora há algum tempo e neste momento sinto que ela existe mais do que vive. Na verdade ela vive, vive em nós, e sempre viverá. 

Quando era pequeno, levou-me para irmos regar milho, lembro-me tão bem do pequeno motor vermelho, dos tubos e dos aspersores, das folhas do milho que cortam.

Um dia parti a televisão dos meus pais e, como castigo, fiquei dois dias sem poder ver televisão. Nesses dois dias, quando eles saíam para ir ao café, ela chamava-me para ir ver um bocadinho de televisão até eles voltarem. 

Vivi dos 10 aos 21, de 1995 a 2005, com a minha avó. Por decisão própria, mas que me foi dada a escolher pelos meus pais (que se mudaram para uma rua mais abaixo). Ela era viúva praticamente desde que me lembrava de ser gente, então foi fácil decidir ficar. Embora eu já fosse autónomo, todos os dias ela se levantava à mesma hora que eu e me aquecia o leite no púcaro, e assim o fez até eu ser adolescente. 

Um dia, porque tinha ser quando ela queria, fomos fazer uma capoeira. Ela fez a massa, meteu os tijolos e eu ajudei conforme ela me indicava.

Não pedi com tempo aos meus pais que me comprassem o livro Ulisses, liguei para casa do telefone do PBX, ela apanhou o autocarro, foi à papelaria, comprou o livro e foi-me levar o livro à escola, evitando que eu apanhasse falta de material.

Levou-me em excursões, enquanto eu quis ir, a vários sítios em Portugal. 

Fossem 2, 3, 4 ou 5 netos ou bisnetos, podiam vir todos ao mesmo tempo que não havia qualquer problema, por ela a porta estava sempre aberta. 

Quando eu vinha do treino, tinha sempre o jantar feito, e aquelas batatas fritas moles sabiam-me para a vida. 

2023 está a ser um ano de reconstrução. Não de reinvenção, não de mudança, mas de reconstrução, de reafirmação do meu Eu, da minha essência básica que determina a pessoa que sou, sempre fui, dos valores que tenho e do exemplo que quero ser. 

Nunca há uma altura boa para que aconteça um evento destes, mas esta é de caras a pior altura. Há coisas que sabemos perfeitamente que mais tarde ou mais cedo vão acontecer, mas não é por isso que deixam de custar. 

Por isso preparo-me para o pior mas, como sempre, espero o melhor. 

05/09/2023

A insustentável incapacidade de chorar...

Há dias em que só me apetece desaparecer. 

Dias esses em que só me apetece chorar. Algo que para mim é extremamente difícil, não sei porquê, já chorei no passado, mas também não foram muitas as vezes. 

O aperto que cresce dentro de mim produz-me pensamentos menos bons, menos positivos, que tento processar e voltar a arrumar na caixinha do "impossível de fazer". 

Mas depois apetece-me partir e deixar tudo para trás, rasgar os laços e ir, para longe, bem longe. Talvez fosse mais fácil de lidar com tudo isto, "estou longe", "não posso", "teve que ser". 

Mas depois lembro-me da pessoa que sou, do que eu considero realmente importante, do que me faz ser eu, e aí a vontade esfria. 

Porque, por muito mais fácil que se tornasse estar longe, acho que seria mais difícil não estar aqui para vos abraçar, para rir com vocês, para ouvir as vossas gargalhadas que me enchem o coração, para estar disponível sempre que precisarem de mim.

A cada dia que passa, cresce a certeza de que vocês são a razão do meu ser e que a minha missão é cuidar, cuidar de vocês, encher-vos de amor e carinho, dar-vos colo, dizer-vos que tudo vai ficar bem e que estou aqui, sempre. 

E, ao escrever isto, uma lágrima caiu. 

30/08/2023

E depois apareceste tu...

Já tinha pensado em voltar a escrever há uns meses, podia ser que me voltasse a ajudar a lidar com os altos e baixos desta vida, se bem que numa fase diferente da mesma. Não faço ideia de quanto tempo passou desde que publiquei pela última vez, mas certamente que ronda os 15 anos. Uma imensidão de tempo, vamos ver quanto tempo dura. Vou escrever para mim, sem nenhum objectivo extra sem ser esse. Já que decidi começar, vou começar com "um raio de sol num dia cinzento". Aqui vai...


Ainda a pior fase da minha vida não acabou apareceste tu. 

Estou grato por teres aparecido na minha vida. Se calhar não estava preparado para lidar com isso (quase de certeza), mas fizeste-me andar nas nuvens, viajar na maionese.  Fizeste-me sentir  de uma forma que eu já não me sentia há bastante tempo. 

Estar contigo fez-me sentir coisas que, de certa maneira, achei que seriam difíceis de acontecer no presente ou num futuro próximo, fez-me colocar em causa verdades que eu achava absolutas e perceber que há sempre uma luz ao fundo do túnel, por mais ténue que seja ou por mais inatingível que eu ache é. 

Não consegui controlar os meus sentimentos e, honestamente, acho que também não o quis fazer. Honestidade e sinceridade, esse meu calcanhar de Aquiles. Se não consegui controlar o que sentia, o fascínio que despertaste em mim, devia ter controlado a vontade de o dizer. Mas a vida é curta e eu estou numa fase em que não quero guardar dentro de mim as coisas boas que sinto pelas pessoas que se atravessam na minha vida. Quis que soubesses o que os meus olhos viram, o que a minha intuição me disse acerca da pessoa que pareces ser e o impacto que tiveste em mim. 

Todas essas emoções fizeram-me sentir leve, retiraram-me um peso de cima que me deixava em baixo.

E talvez pelo receio de me voltar a sentir da mesma forma que me sentia antes de apareceres, para que o peso não voltasse, para que continuasse a viajar, falei muito, de mais e embora não me arrependa, tenho a noção que teve o efeito contrário ao desejado. 

Olhando para trás, o que passei ao longo da vida preparou-me para tudo o que tenho passado no último ano e meio. Já não foi a primeira vez, nem será a última, razão pela qual te disse que nada tinha que mudar, mas percebo que assim seja. Sentimentos vão e vêm, aparecem e desaparecem, acordam e adormecem, mas tudo passa, tudo.

Está tudo bem, já passou, guardei numa caixinha as recordações da tua doce voz, do teu sorriso bonito, da tua gargalhada, do teu toque, dos teus beijos e do calor do teu abraço. Foste incrível, perfeita, não mudava um segundo que fosse. Continuo a achar que és uma pessoa boa que merece o melhor que este mundo tem para oferecer. 

 E estou grato por ter acontecido, tal e qual como aconteceu, mesmo que nunca mais se repita, que não te volte a ver ou estar contigo.